Vulcão Tupungato

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O Vulcão Tupungato é um estrato vulcão inativo com seu cume atingindo os 6.565 m de altitude, conforme medição oficial pelo exército chileno. Está localizado na Cordilheira dos Andes e é dividido praticamente ao meio no sentido norte/sul pela fronteira entre o Chile e a Argentina, na altura de San José de Maipo, à 1 hora e meia de Santiago. Pelo lado argentino, entra-se pelo departamento de Tupungato, que faz parte da Provincia de Mendoza.


Apenas como alusão a uma definição de parâmetro de dificuldade, em alguns pontos é mais difícil e perigoso atingir o cume do Vulcão Tupungato do&nbsp, que o cume do Cerro Aconcágua, apesar dos 397 m a menos.

O Vulcão Tupungato está na área da Cordilheira dos Andes chamada Cordilheira Central. Aqui o clima é mais rigoroso devido à baixa umidade no ar e as condições climáticas que mudam com velocidade impressionante, e às vezes com violência igual.

Em 10 dias de caminhada no Parque Provincial del Tupungato, avistamos, apenas por 3 minutos, um grupo de arrieiros passeando a cavalo com a família.
Não há guarda parque, nem qualquer tipo de acomodação parecida com um refúgio, nem possibilidade de resgate de qualquer espécie.

Segundo informação de funcionários de uma das mineradoras que exploram a área do parque, com base em um acontecimento ocorrido 2 dias antes de nossa entrada ao parque, um companheiro de trabalho que estava fazendo sondagem pelas montanhas e acabara de almoçar, ao tirar o capacete da cabeça para descansar, foi atingido por uma pedra arremessada da encosta pelos ventos muito fortes que ocorrem nesses vales.
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Disseram ter solicitado helicópteros para resgate e todos deram a mesma resposta: “Não há condições de voo naqueles vales”. O companheiro morreu algumas horas depois de ser atingido, ou seja, é uma área que está por conta própria.

No dia de ataque ao cume, é preciso transpor um trecho que envolve escalar em rocha a aproximadamente 6.400 m de altitude.

Já com a aclimatação pré-adquirida no Cordon del Plata, foram 7 dias para tentativa de atingir o cume e 3 dias para voltar até a cidade mais próxima, San José de Maipo.

A expedição

Esta expedição foi dividida em 2 partes.

A primeira parte foi onde nos aclimatamos, que consiste em acostumar nosso organismo a todas as intempéries relacionadas com a altitude, entre elas estão a baixa concentração de oxigênio e o frio. Essa área é chamada Cordon del Plata e pode-se ter um acampamento-base a partir de 4.200 m até 4.500 m de altitude, que possibilitam o ataque de pelo menos 4 montanhas entre 5.000 m e 6.000 m de altitude, contando também com um refúgio chamado Mausy, a poucas horas de caminhada, o que nos traz uma certa segurança.

Em 5 dias atingimos o cume do Cerro Vallecitos, com 5.450 m, e passamos os 3 últimos dias acampados a 4.500 m.

A equipe da expedição contou com 3 membros, Eduardo Tonetti e Mateus Vieira, ambos com experiência em alta montanha, e Zafrir Schop, que experimentou pela primeira vez em sua vida o que era caminhar em alta montanha. Conhecemos Zafrir (que preferia que o chamássemos de Zif) no Hostel Internacioal Mendoza, um dia antes de subirmos para o Cordon del Plata.

Ele é de Jerusalém – Israel, e estava viajando pela Argentina havia 3 meses, estudava espanhol e fala fluentemente inglês e hebreu. Apesar de uma certa dificuldade inicial em conversar, ora em espanhol, ora em inglês, ele tornou-se nosso mais novo amigo de infância e seguiu para as montanhas com a gente dali em diante.

Passamos o período de 19/12/2009 a 26/12/2009 no Cordon Del Plata, em Vallecitos, para atingir o cume do cerro Vallecitos, a 5.450 m de altitude. Fazia muito frio e ventava bastante, como sempre.

No dia 24/12/2009, chegamos ao cume em apenas 2 horas e meia. Apesar de estarmos bem equipados, o frio que faz nessas altitudes já é baixo o suficiente para termos de nos proteger. Os ventos que atingiam grande velocidade, e geralmente por sua força, nos arremessavam a um passo ou dois da trilha e abaixavam ainda mais a sensação térmica,&nbsp, nos fazendo sentir um frio de -30 graus Celsius. Tive que colocar as mãos nos bolsos para conseguir sentir novamente a circulação nos dedos,&nbsp, que doíam muito de tão frios que estavam.

Em cinco dias, atingimos 5.450 m de altitude. Estivemos a 4.550 m acampados por 4 dias e 3 noites e nosso organismo respondeu a contento. Em sete dias, já estávamos de volta a Mendoza com todas as comodidades, inclusive O2 em quantidade suficiente pra digerir tudo que comeríamos até o início da escalada do Vulcão Tupungato, no Chile.

Vulcão Tupungato

6/1/2010 a 16/1/2010

Comemoramos o ano-novo em Mendoza, no Hotel Malbec, onde nos sentíamos em casa. Dia 01 de janeiro, fomos ao Chile para a nova aventura e nosso objetivo maior. Fomos ao DIFROL – Dirección Nacional de Fronteras y Límites del Estado (www.difrol.gov.cl), e um dia depois de preencher os documentos necessários para dar entrada em nossa solicitação de autorização para entrar em área particular e de fronteira, já a tínhamos em mãos. Após um descanso merecido e boa alimentação, voltamos para a montanha.

Chegamos dia 5/1/2010 na entrada do GENER – AES, e dessa entrada até o início da trilha são aproximadamente 35 km. Dormimos em uma área à direita da portaria para entrarmos nessa caminhada no dia seguinte bem cedo.

Dia 6/1/2010 – Com uma hora de caminhada, uma pickup passou por nós e me arrependi de não ter pedido carona, mas a segunda oportunidade eu não deixei passar. E não é que funcionou? Era o veículo de uma das mineradoras que ficam praticamente no início da trilha que nos levaria ao Tupungato. Uma verdadeira bênção, pois economizamos 1 dia e meio de caminhada.

E, assim, chegamos por volta de 11h30m na entrada da trilha para a parte alta do vale do Rio Colorado.

Algumas horas depois de começarmos a caminhada, já nos deparamos com o primeiro desafio dessa empreitada nada convencional: Estero Del Azufre, uma corredeira com aproximadamente 5 m de largura, e a profundidade nunca se sabe ao certo, mas o volume de água praticamente elimina a possibilidade de atravessar caminhando pela água. Algum tempo atrás, havia uma ponte, mas estava destruída. Achamos algumas tábuas com algo em torno de 1,20 m de comprimento e 25 cm de largura, que foi o que nos proporcionou uma ponte entre algumas rochas, e apesar de sua instabilidade foi melhor que saltar de uma rocha pra outra com 30 kg nas costas e&nbsp, numa superfície molhada pelos borrifos de água que a força da correnteza jogava.

Atravessamos outro rio logo à frente, Estero Del Museo, mas agora com uma bela ponte e acesso a água boa. Caminhamos por mais alguns quilômetros e paramos em uma área que parecia ser usada por arrieiros. Acampamos essa noite a 2.900 m. A vista é gigantográfica, tudo ao nosso redor é enorme. O vislumbre de um amontoado de rocha magmática negra na base de uma planície de 1 km, beirando uma parede de rocha com 300 m à sua direita e à sua esquerda o rio Colorado, seguido de uma parede que, às vezes, chega a 1.200 m acima de onde estamos, impressiona.

Dia 7/1/2010 – Com 1h30m de caminhada chegamos a uma área com água, recarregamos os camelbags e continuamos a caminhada, que prometia ser tão longa ou mais do que a do dia anterior. Estávamos a caminho de Baños Del Tupungato, onde achávamos que teria uma boa área para passar a noite. O desnível é pequeno, saímos de 2.900 m e após um dia de caminhada estávamos a 3.000 m.
Num ponto da trilha achamos que estávamos errados e decidimos acampar ali mesmo, para que no dia seguinte pudéssemos avaliar as possibilidades.

Dia 8/1/2010 – Ao amanhecer, levantamos acampamento e subimos a encosta a leste para nos situarmos melhor no mapa. Chegamos ao consenso de que deveríamos seguir pelo caminho que estávamos no dia anterior. E, dessa vez, achamos a trilha do outro lado do riacho que atravessamos no fundo do vale e pudemos nos colocar no rumo certo novamente.

Ao final desse vale, passamos por uma enorme parede a nossa esquerda, chamada Cordón del Bizcocho, e por uma área verde, com água e tufos de plantas. Logo que atravessamos um estero de rocha por aproximadamente 1 km, começamos a subir na encosta a nossa direita, nos levando para dentro de outro vale que nos deu acesso ao Portezuelo del Tupungato, na fronteira, a 4.760 m.

Achamos uma área a 3.600 m, atrás de uma grande rocha que nos abrigaria do vento e onde havia uma boa fonte de água por perto. Estávamos agora ganhando altitude com maior rapidez.

Dia 9/1/2010 – Como todos os dias, acordamos, tomamos o café da manhã, um mate e recomeçamos a caminhada. Nesse dia, lavamos todos os utensílios de cozinha, porque não sabíamos se no próximo acampamento haveria água corrente ou apenas gelo e neve.

Nós nos abastecemos de água e seguimos, agora em direção a um acampamento a 4.200 m.

A falta de oxigênio nessa altitude já se faz sentir, o progresso fica mais difícil ainda, quando temos que subir uma encosta cravada de penitentes, que são estruturas de gelo esculpidas pela ação do sol e do vento que lembram pessoas em posição de penitencia. Entretanto, ao chegarmos na área aos 4.200 m de altitude, nos deparamos com um piso relativamente plano e paredes de rochas que ajudaram a minimizar o vento que subia o vale. Para ajudar ainda mais, o visual nos 360 graus era de lindos picos nevados, a encosta oeste e o próprio vulcão nos espiando a sudoeste, só pra ver como estávamos nos saindo. Às 20h já havíamos jantado, e lá pelas 22h realmente escurece.
O pôr do sol é indescritível.

Dia 10/1/2010 – Começamos o dia subindo encostas bem íngremes. O vento era forte e oscilante, o que nos desequilibrava e dificultava a caminhada. O solo é solto e a crista é muito exposta ao vento. A temperatura ambiente estava próxima de zero grau, mas, com o vento que nos açoitava, a sensação era de 15 graus negativos. Subimos por mais de 1h30m nessas condições. Quando o terreno declinou, começamos a visualizar a possível área para acampar.
Chegamos a 5.200 m, apesar do altímetro do relógio mostrar 5.000 m. O vento não dá trégua. Desse ponto, a vista fica ainda mais magnífica: surge o Aconcágua e a uma porção enorme dos cumes dos Andes a quilômetros de distância.

Dia 11/1/2010 – Depois de uma noite relativamente tranquila, levantamos para um dia de aclimatação. Ficamos o dia todo nesse acampamento, com exceção de uma caminhada até a crista da divisa do Chile e Argentina. A vista é magnífica: a leste é Argentina e a oeste é território chileno. A partir dessa posição, pode-se ver o Cerro Plata a nordeste.

Às 21h, o vento começa a ficar mais intenso. Por volta de 1h30m da madrugada, tivemos que sair da para reparos nas barracas. A do Mateus estava com o teto afundando, e ele amarrou as varetas que estavam para o lado do vento, ancorando o teto. Na minha, um cordim que prende a ponta esquerda do avance se rompeu. Com uma fita de escalada de 60 cm, dei uma boca de lobo na alça da barraca e envolvi uma rocha de uns 40 kg com a outra extremidade da fita.

Dia 12/1/2010 – Pela manhã o vento abrandou, mas assim que atingimos a crista da divisa ficou bem difícil. Já estávamos a 5.300 m, com temperaturas negativas, ventos de 50 km/h e rajadas que nos tiravam do lugar. A 5.450 m chegamos a uma rocha que daria abrigo para apenas uma barraca, e foi lá mesmo que ficamos. Não tínhamos mais vontade de caminhar naquelas condições, então resolvemos ficar ali mesmo para, na manhã do dia seguinte (13/1), sairmos por volta das 5h em direção ao cume, e poderíamos contar com a possibilidade de uma diminuição no vento.

Dia 13/1/2010 – Acordamos às 3h30m, com uma temperatura de -13,5 graus Celsius dentro da barraca. Tomamos um breve café da manhã, preparamos um chocolate quente para o caminho e saímos às 5h para iniciar a caminhada. E lá estava ele, o vento, implacável, frio e imprevisível. Caminhamos em direção à crista para ver se o vento aliviava um pouco, mas só depois da crista é que abrandava. Vimos o nascer do sol e voltamos a caminhar, e, com 1 hora a mais, estávamos na área chamada Camp Argentina – 5.800 m. Vimos que não havia condição de continuar naquela situação por muito tempo sem correr riscos e decidimos voltar.

O que mais pesou foi o fato de termos que passar por uma escalada de baixa dificuldade, mas que com aquele vento poderia representar o pior pesadelo: uma queda de 3 m de altura pode colocar a vida de alguém em risco nesse lugar.

Era mais sensato voltar. Ficamos por muitos dias em alta montanha, e isso, a meu ver, vale mais que cumes, apesar de eu ir às montanhas com o intuito de atingi-los. Mesmo assim, sei que colocar a vida em risco mais do que nossa sensatez consegue aceitar é não respeitar aqueles que não conhecem tais condições e confiam que você irá respeitar os limites.

A montanha sempre estará lá e dependemos da volta do montanhista para ouvir suas histórias.
Voltamos à barraca para nos recompor e às 10h30m já estávamos descendo o vale.
Demoramos três dias para sair do parque, e a travessia do Estero del Azufre foi, de certa forma, mais fácil que a primeira vez. Achamos uma tábua com uns 20cm a mais de comprimento, o que melhorou a estabilidade na pedra.

Ao chegarmos na área da mina, pedimos carona novamente para um pequeno caminhão que estava descendo até San José de Maipo, mas ele não podia nos levar além da portaria. Chegando lá, pegamos outra carona numa van até a cidade.
Foi muito gratificante pelo menos poder escalar esse vulcão, porque, desde 2004, tenho ido para a Argentina com o intuito de escalar essa montanha maravilhosa pelo lado argentino e não havia conseguido nem chegar nela. Então, não tenho nada a reclamar. Sem contar as companhias, Mateus e Zif, duas figuras que se mostraram confiáveis companheiros para ir à montanha, além de grandes amigos.

Eduardo Tonetti

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