Perrengue no Vale do Preguiça

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O Rio dos Macacos é o maior tributário do Rio Mambu, situado entre os municípios de Embu Guaçu e Itanhaém, as margens do Núcleo Curucutu do P E Serra do Mar. Além de suas águas abastecerem a majestuosa Cachu do Funil, o Rio dos Macacos notabiliza-se principalmente por cavar um estreito cânion durante td seu trajeto até sua foz. E foi justamente este imponente desfiladeiro, q atende pelo nome de Vale do Preguiça, q acabamos palmilhando na tentativa de aceder à Cachu do Funil por sua vertente leste. O resultado da empreitada foi um circuitão q desceu td um afluente do Macacos até o fundo do vale, percorreu um trecho considerável deste cânion virgem até seu vértice, na Cachu do Funil, e finalmente retornou por sua picada “oficial”. Um circuitão casca-grossa com escalaminhada, vara-mato, pernoite improvisado, chuva e mto frio q sequer arranhou parte dum cânion q decerto nunca teve pés aos sopé de seus imponentes paredões.

Qdo a idéia oficial (um rio pouco conhecido em Cubatão) foi abortada por conta do tempo escasso prum bate-volta deveras puxado, imediatamente perguntei ao Nando qual seria então o “Plano B” na manga. “Cachu do Funil, oras! Programão ideal e sussa!”, respondeu ele. Já tinha ouvido falar dessa queda mas sinceramente nunca me interessei de pesquisar mais a fundo, motivo pelo qual deixei a trip td nas mãos dele. “Fica frio! Já marquei os ptos através do Google Earth e estudei bem o trajeto!”, garantiu ele. Então simbora, ne? Mal sabia q o singelo bate-volta resultaria num perrengue nababesco q abriria meus olhinhos prum espetacular cânion q sequer constava no roteiro oficial e decerto nunca sentiu o cheiro de pés humanos palmilhando aquele leito pedregoso revestido de limo visguento.

Após percorrer a lotada Linha Esmeralda do Metrô até seu pto final, no Grajaú, encontrei o Nando la pelas 8:30hrs na catraca da estação conforme o combinado. Aquela manhã ostentava uma nebulosidade clara atípica diante dos dias tremendamente claros das semanas anteriores. Contudo, o calor abafado permanecia o mesmo, embora a previsão anunciasse uma frente fria chegando senão naquela noite, quiçá pela manhã sgte. “Ah, o bate-volta vai ser rapidão!”, pensei comigo mesmo. “E neste calorão nada melhor q uma cachu pra refrescar!”, completei comigo mesmo, ignorando totalmente uma eventual virada de tempo.
Após um rápido desjejum numa padoca próxima, tomamos o busão “226-Embu Guaçu-Chácara Florida” no terminal dali mesmo (Term. Grajaú), ao lado do Metrô, e lá fomos nós. Ai começou uma viagem q pareceu interminável, onde atravessamos boa parte do restante de Sampa até dar no extremo sul da maior metrópole da America do Sul. Não tardou pro cinza tipicamente urbano dar lugar ao verde a nossa volta, e logo os emplacamentos anunciavam estarmos nos arredores de Parelheiros. Após uma breve parada no minúsculo terminal do bairro Cipó, o busunga finalmente se pirulita rumo Embu-Guaçu, acompanhando uma linha férrea q me é conhecida doutras trips: é o ramal da Sorocabana q segue pra Evangelista de Souza e, finalmente, Itanhaém.

Chegamos ao centrão de Embu-Guaçu por volta das 10hrs, onde desembarcamos na frente do cemitério e tomamos imediatamente outro latão, o “Municipal Sta Rita”, q deixou aqueles cafundós pra trás pra se embrenhar onde o “Judas perdeu as botas”. Claro q deixamos o motora de sobreaviso q queriamos descer no Bairro Penteados. Após percorrer um tanto pela Rodovia José Simões Louro Junior (SP-214), saltamos a margem da mesma, um pouco antes duma placa decrépita anunciando “Trilha dos Manacás”, no km 58, as 10:30hrs.

Observamos o latão se perder estrada acima rumo seu destino final e imediatamente nos pusemos em marcha. O Bairro Penteados não passa de um punhado de casas, um posto de saúde, uma mercearia e um bar a beira da estrada e foi neste ultimo q fomos coletar infos q complementassem o q já tínhamos em mãos. O dono, o solicito e falante Alexandre, foi logo dizendo qdo indagamos sobre a direção da Cachu Funil: “Ah, ces vão se perder! Precisa de guia pq é mto confuso!”. Bem, isso já era previsível, mas o bom era q o jovem empreendedor nos deu uma estimativa do qto teríamos q andar ate o inicio da trilha. “Algo de 12 ou 13km!”, frisou ele. Bem, de qq maneira tinhamos uma meia duzia ptos referenciais plotados no GPS  e, em tese, tomaríamos as estradas ou picadas q fossem na direção deles. Esse era o nosso plano e, basicamente, o suficiente pra gente. Alias, sempre foi assim pq esse é o principio da navegação.

Após um refri pra refrescar a goela naquela manhã estupidamente quente, pusemos então pé-na-estrada na sequencia. E tome estrada de terra pela frente! Após andar um pouco pela Estrada do Belvedere deixando o pacato bairro pra trás, tomamos então outra via pela esquerda q atende pelo nome de Estrada do Casimiro. Com as mesmas características q a anterior, esta precária via serpenteia sentido sudeste uma sequencia de morrotes salpicado de sítios, q começam a rarear conforme mais se avança.

Felizmente, a boa providencia tava a nosso favor pois não deu um tanto de pernada por aquela estrada enfadonha q conseguimos carona num improvável busão escolar, q naquele horário garimpava a escassa molecada q ali, naquele fim de mundo, consegue não somente viver como tb ter um ano letivo regular. O fato é q esa carona foi mais q bem-vinda e nos poupou bons kms! O ruim foi q passamos batido (pra esquerda) por uma bifurcação em “T” onde a Estrada do Casimiro passa a se chamar Estrada do Mambu. Mas como o busao ia apenas ate o bairro Sta Rosa (próximo dali, a nordeste) e logo retornaria, decidimos permencer nele e assim descer em seguida no lugar certo.

Pois bem, o fato é q saltamos na tal bifurcação em “T” um pouco depois do meio-dia, e imediatamente nos pusemos a andar pelo ramo q nos passou desapercebido antes, ou seja, pela direita. Esta estrada de terra basicamente acompanha boa parte do trajeto um borbulhante córrego q, pela carta, tem o nome de Ribeirão da Cachoeira. Não andamos nem um pouco pra constatar q realmente o córrego faz jus ao nome. Uma simpática queda a beira de estrada aparentemente convida andarilhos a se refrescarem em suas águas geladas. Digo aparentemente pq a tal queda dágua atende pelos locais pelo pouco convidativo nome da Cachu da Macumba, q infelizmente faz jus ao nome. Despachos, velas, pratos com farofas e frangos em decomposição emporcalham o entorno do q poderia ser um maravilhoso e bucólico lugar de banho. O Nando q tava animado em se refrescar naquele calor de meio-dia desistiu assim q viu as condições do lugar. Uma pena.

A pernada mantém o mesmo compasso sempre sentido sudoeste. Uma placa á nossa esquerda nos avisa laconicamente estarmos nos limites do Nucleo Curucutu, do Pq Est. Serra do Mar. Não tem erro, pois a própria estrada nos mostra o caminho, ignorando o Sitio Okinawa, á direita, outra fazendinha com estridentes cães, á esquerda, assim como nova bifurcação q segue pra esquerda. Após esta última é q de fato mergulhamos no fora outrora alguma antiga estrada, parcialmente tomada pelo mato, em meio a morrotes cobertos por eucaliptos. Passamos por um casebre abandonado, lugar supostametne q devia ser a residência dum tal Champinha, cruzamos uma manilha num correguinho ate finalmente dar as margens dum simpatico laguinho, onde revoadas de libélulas pontilham a atmosfera já preenchida por um espesso mormaço.

Aqui basta tomar a bifurcação de bordeja o laguinho pela direita e por ali seguir indefinidamente. Estamos enfim numa picada propriamente dita, desta vez acompanhando o pequeno córrego q supostamente abastecia o já mencionado laguinho. O avanço é tranqüilo pois a picada ta bem batida e é bastante obvia. Chapinhando nalguns trechos logo nos deparamos com um córrego maior, q passamos a acompanhar pela direita durante um bom trecho, mas q logo é cruzado mais adiante varias vezes. Pausa pra molhar a goela e abastecer os cantis, claro.

Mergulhando enfim na mata fechada, serpenteamos os abaulados morrotes q nossa frente sem percalços. Nas bifurcações q surgem a nossa frente tomamos o ramo q mais se aproxima do pto plotado pelo Nando. No geral, sempre pegávamos o ramo da esquerda. O pto principal era a cachu, e a questão era apenas se chegaríamos nele pela vertente leste ou oeste do vale. Isso quem iria definir seriam as condições do terreno a nossa frente. Desta vez nossa rota tendia pra sudeste-leste e a trilha aparentemente estava em bom estado, sem gde perda de desnível. A vegetação, por sua vez, alternava-se entre predominantemente mata secundaria, espessos bambuzais e pequenos arbustos.

Foi apenas qdo faltavam apenas 1,5km pra atingir o pto plotado q reparamos q a rota tendia pra leste e começou a se afastar do nosso objetivo. Mas qdo a picada, enfim, sumiu q finalmente paramos pra pensar e tomar alguma decisão. Retornar ou varar-mato? Voltamos então um pouco afim de atentar se alguma picada secundaria havia passado desapercebida e logo encontramos a dita cuja, indo no sentido desejado. Entrando por ela logo percebemos estar numa antiga vereda de carvoeiros desativada, bastante comuns em Paranapiacaba. Um antigo forno cavado na encosta corrobora nossas suspeitas.

Mas não deu nem 10min q a famigerada picada sumiu tão subitamente qto havia surgido na nossa frente. E agora, Jose? Dar meia-volta e retornar de forma inglória? De jeito algum. Estavamos quase ao lado da encosta principal do vale e dali então decidimos azimutar na direção da cachu e rasgar mato no peito, simplesmente. E lá fomos nós, alternando a dianteira na árdua tarefa de abrir caminho na raça, e dessa forma nosso avanço foi lento, porém satisfatório. Subimos e descemos pequenos morrotes, caímos em selados repletos de brejo, galgamos suaves cristas secundarias com sinais de fezes de antas, e por ai vai.

Atingir finalmente a beirada do vale nos deu um fôlego de esperança, pois ate então já estavamos tds imundos, ralados e repletos de mato por tds entranhas e orifícios pelo corpo. O aparelhinho do Nando marcava exatos 750m de altitude e agora a tendência era o numero apontado pelo visor despencar vertiginosamente. E foi então q começamos a descer a pirambeira pelo q parecia um leito seco dum pequeno afluente do Rio dos Macacos, onde o avanço era ate facilitado por não ter mato no caminho. Mas logo este afluente encontrou outro onde escorria um pequeno filete dágua q nunca veio em boa hora e refrescou nossa goela como se fosse um revigorante refrigerante (e breja, no meu caso).

Comecamos então uma constante desescalaminhada pelo mesmo, ora cuidadosamente pelas pedras ensaboadas de limo ora pela íngreme encosta qdo o rio apresentava seus típicos altos degraus verticais como obstáculo. Nestes trechos chegávamos apenas na beirada dos precipícios pra avaliar o terreno e apreciar os fundos cânions q o referido regato cavava a nossa frente, formando pequenas cachus e pocinhos, pra então desviar deles pela íngreme encosta, como se fossemos macacos nos firmando na mata a disposição, ora pela esquerda ora pela direita, ate alcançar o patamar sgte. Frestas na vegetação nos davam rápidos vislumbres não somente do verdejante Vale do Preguiça como tb da nossa posição na encosta em relação ao fundo do mesmo.

Entretanto, o Nando reparou pelo GPS q, embora estivéssemos dando duro no avanço, a perda de altitude era irrisória e q já estavamos atrasados de acordo nosso cronograma inicial, q previa 14hrs estarmos na cachu. Além do mais, o Mambo ainda era inaudível, sinal q estavamos distantes. Eram 15hrs e, a beira daquele córrego verticalizado paramos novamente pra avaliar nosso avanço e tomar alguma decisão, já q nossa preocupação era a noite nos surpreeder no meio da mata. Voltar pelo caminho certo ou prosseguir em ralação incerta? Bem, em comum acordo decidimos prosseguir e seja o q Deus quiser. Nossa idéia era chegar no fundo do vale, subir o rio ate a cachu e dali retornar pela picada principal. Nossa esperança era ainda ter luz natural ate lá. Aproveitamos a breve parada pra comer alguma coisa; no caso, apenas o Nando conseguiu engolir seu lanche, já q eu tava adrenado em apenas prosseguir e dificilmente sinto fome nessas ocasiões.

E lá fomos nós perdendo altitude no mesmo esquema anterior, ou seja, atraves da desescalaminhada de pedras do riozinho alternada pela íngreme encosta, onde nossa tendência era seguir por cristas menos verticalizadas e mais amistosas ao nosso avanço pelo mato. Espinhos na mão, queimaduras e muitos arranhões foram os brindes extras deste trecho. Ate q finalmente, após uma árdua desescalada quase vertical, finalmente caímos no leito de pedras roladas do majestuoso Rio dos Macacos, as 16:20hrs. Estavamos ali, no meio dum imponente cânion de elevados paredões de ambos lados, extremamente felizes por aquela ralação ter chegado ao fim. “O pior já passou!”, pensamos, e nos brindamos então com um rápido pit-stop de descanso ali, mergulhando nos poços convidatos daquele belo trecho menos encachoeirado do Rio dos Macacos. A água fria não apenas nos refrescou e removeu td sujeira depositada no corpo como tb nos lembroiu dos inúmeros cortes e ralados q tínhamos pelo corpo, ardendo ao menor toque. Mas o melhor mesmo era a satisfação de ter vencido quase 200m de declividade na unha!

Prosseguimos noss incursão na sequencia, desta vez simplesmente subindo rio acima. Pelo GPS  faltava algo em torno de 1km pra alcançar a cachu, e deduzimos q no ritmo q estavamos chegaríamos la coisa de uma hora. Felizmente aqui o rio não é mto acidentado, embora os altos e imponetes paredões q nos espremiam de ambos lados sugerissesm o contrário. O avanço foi ate q relativametne fácil, sempre pelo leito do rio ou dentro dele, enfiando a bota ate o joelho. Ir pela encosta já era mais difícil não apenas pela declividade como pela presença de muito mato caído e tombado do alto. E assim, emparedados por muralhas forrada da mais pura mata, prosseguimos arduamente nosso avanço, motivados basicamente não mais pela cachu e sim pela necessidade de encontrar a vereda principal pra voltar em segurança.

O céu já havia se encoberto já a algum tempo mas o estrondo de trovões apenas confirmaram q a frente fria prevista pela meteorologia chegara mais cedo na serra. Dito e feito, bastou os primeiros respingos fustigarem o rosto pra ensacar td dentro da mochila como pra redobrar cuidado na subida do rio. Cuidado mais q essencial uma vez q aquele cânion é tão estreito q raramente entra luz natural e, portanto, vive úmido e suas pedras estão perenemente lisas feito sabão. E la fomos nós, cruzamos com belos e bucólicos remansos, incontáveis poços e piscinas convidativas, alem do belo visual q se descortinava a cada curva do rio.

Ao nos aproximar dum grande rugido q passou a dominar o fundo do vale é q tivemos certeza q já estavamos perto da cachu. Dito e feito, as 17:40hrs alcançamos o enorme poço ao sopé da bela e imponente Cachu do Funil, na cota dos 530m, situada no vértice daquele majestuoso cânion q ES espicha por td o Vale do Preguiça. A cachu possui 3 enormes patamares de onde a gaua despencava furiosamente, totalizando algo de 50m ou ate mais. A chuva, claro redobrara este volume tornando o espetáculo realmente tão belo qto assutador. Infelizmente o tempo estava se esvaindo rapidamente naquele cafundó perdido do vale e não tivemos sobra alguma pra curtir nem nada. Ate as fotos pra registrar o momento ficaram bem escuras pelo horário avançado, sem falar q poupei mais retratos com medo de chuva avacalhar minha maquina.
Mas o tempo de contemplação foi curto pois tínhamos q vazar rapidamente dali, e assim mal chegamos naquele belo lugar nos pirulitamos piranba acima, atraves da obvia trilha deacesso principal. E tome piramba vertical!! Este trecho lembra facilmente o trecho final da trilha pro Poço das Moças! A vereda é quase vertical e é preciso se firmar no arvoredo ao redor pra ganhar altitude! Como tava chovendo o chão de terra  estava liso feito sabão e isso dificultou nosso avanço. Num trecho ambos despencamos perigosamente e ficamos imundos. O pior foi q nesse tombo perdi meu óculos. Eu já dava eles por perdidos qdo os olhos com visão termográfica do Nando encontraram eles milagrosamente. Te cuida, Predador!

Pois bem, ganhamos a cota dos 700m num piscar de olhos e já com a chuva dando uma trégua a picada enveredou pra oeste atraves de uma suave crista, como q tendendo a dar uma volta pelo vértice do vale. Contudo, áquela altura do campeonato o manto negro da noite já estava repousando sobre td Vale do Preguiça, razão pela qual redobramos não apenas o cuidado em não perder a bendita picada como tb a cautela em não pisar em falso naquele terreno incerto. Foi ai q tive minhas duvidas de q sairíamos dali ainda naquele dia.

Mas foi qdo a rota nos levou ate o q parecia ser uma clareira q a trilha sumiu de vez, gerando duvida qto sua continuidade, q minhas duvida apenas se confirmava. Iluminando o caminho apenas por uma minúscula lanterna, tentamos tds as possibilidades a nossa volta. Havia ate uma trilha q acompanhava um correguinho próximo mas q sumia em meio as pedras. Eu estava exausto e sentei na clareira enqto o Nando ainda zanzou pelos arredores a procura dum caminho (entenda-se, trilha larga e obvia) q seguisse na direção correta. Nada. “Fudeu!”, pensei. Paramos pra então avaliar as alternativas e sugeri ao meu amigo q simplesmente passássemos a noite ali conforme desse, e q bem cedo na manhã sgte encontraríamos facilmente a rota. Afinal, já havia passado por isso e a experiência me calçou q com luz natural td fica mais facil, evidente e seguro. Pra mim, andar a noite, cansado e exausto tava fora de cogitação. O Nando ainda bateu pé de q queria andar noite adentro e até varar-mato pra sair dali, mas consegui dissuadi-lo de q isso não seria nada sensato, alem de perigoso. Se era pra passar a noite q fosse ali naquela clareira plana, pois via bem improvável conseguir outro lugar “confortável” assim naquele ingreme vale.

Resignados então naquela condição inesperada, nos sentamos esperando a noite passar. Ou apenas tentar isso. Não era a primeira vez q era forçado a passar a noite no mato, e nem seria a ultima. O ruim era q estavamos totalmente despreparados pra isso: contavamos apenas com a roupa do corpo, molhada, e não demorou pro corpo esfriar e o frio tomar conta da gente. Sem anorake, blusa, lona, barraca, comida, etc. De fato, aquela seria uma longa noite. Mas ainda assim, ficar ali era o mais lógico, seguro e racional a fazer. Exausto, me aninhei no chão em posição fetal e fiz da mochila travesseiro, queria apenas descansar. Na mochila encontrei um pequeno jornal (Metro, aquele q entregam nos faróis) e me cobri de modo aquecer; mendigo sabe das coisas já q papel de jornal retém o calor. Claro, desde q não esteja úmido.

Foi ai q a chuva voltou de vez. Lei de Murphy é foda. Isso sem contar os mosquitos, q começaram a atacar mesmo no frio. Ensopado, não demorou pra voltar a tiritar de frio, mas foi ai q encontrei uma capinha plástica (daquelas de 5 pílas de camelots) no fundo da mochila q me cobriu. Já o Nando não quis saber de deitar e permaneceu o tempo td sentado, se cobriu a cabeça com uma toalha de mão e as pernas com uma blusa extra de algodão, e tentou dormir assim. Mas não sem antes escovar os dentes, diga-se de passagem! Fome? Q nada, naquela situação o q menos passou na cabeça era sentir fome, já q o pior foi mesmo o frio. Sim, foi ele o gde diferencial da noite e gerou alguns atritos com meu amigo, mas claro q foram apenas discussões fortuitas e desnecessarias decorrentes daquela situação extrema a q ficamos sujeitos inesperadamente. Espécie de “BBB natureba”, so q sem câmeras pra registrar nosso infortunio.

E assim a noite transcorreu longa e interminavelmente. Ambos dormimos um sono bem picado, despertando no meio da noite apenas pra constatar q o negrume no firmamento pairava, sem nenhum vestígio de alvorada no horizonte. Rajadas de vento remexiam o arvoredo ao redor, lançando a umidade depositada nos galhos sobre a gente voltando a ensopar nossas vestes. Deitado no chão, mesmo úmido e sem isolante, minha superfície exposta ao vento frio era reduzida e me garantia algo de “conforto”. O duro era a roupa molhada, q fazia eu bater o queixo constantemente e tere espasmos involuntários dos músculos do corpo. Vestia a capa mas ela apenas era conforto provisório, pois logo a transpiração tornava a encharcar a roupa, me obrigando a removê-la com frequencia pra me manter seco. O Nando, por sua vez, creio q teve sorte menor. Sentado, quase nem dormiiu. Passei pra ele tds minhas sacolas plásticas de modo a q se protegesse como desse, mas creio q mesmo assim foi insuficiente, já q td noite conseguia ouvi-lo se queixar disso ou aquilo. Paciência. Uma hora o dia amanhece.

E eis q nosso martírio chegou ao fim qdo os primeiros sinais de luminosidade atingiram o vale após aquela maledita noite. Quebrados e td doloridos pusemo-nos a andar assim q td ficou mais claro e obvio pra gente, as 6hrs. Descansados, não tardou pra reencontrar a trilha perdida, de fato escancarada a nossa frente. Uma outra variante seguia pro sul, passando por um acampamento desativado de caçadores (ou palmiteiros) q tinha uma lona de plástico q poderia facilmente ter sido util naquela ingrata noite. Contudo, tomamos a picada mais obvia q contornava o vale inicialmente seguindo pro norte, desviando lentamente pra leste.
Bordejamos e subimos varias encostas, alcançamos varias cristas e nos deparamos com algumas bifurcações, onde o bom senso prevaleceu e nos indicava o sentido correto a tomar.

Agora não havia mais erro, com luz td é muito mais facil. Ate qdo a trilha sumia em meio a mata (fruto de arvores caídas) a continuidade era logo reencontrada adiante, algo q seria improvável durante a noite. É, no dia é td mais facil, embalados pelo canto das arapongas e martelar dos pica-paus na mata. Cruzamos vários riachos ate q logo nos vimos bem afastados do vale principal, indo pra nordeste rumo a trilha q já conheciamos. Era nosso adeus ao Vale do Preguiça. Pra facilitar, a picada estava marcada por trocentos papeis de bala “Lovemania” (sabor hortelã) q algum trilheiro-porcão ou caçador-suíno sequer se deu o luxo de trazer de volta. Foi ai q reparei minha bota dando sinais de desgaste ao solado descolar parcialmente. É, pelo menos guentou bem aquele perrengue inesperado e foi valente até o final.

Resumindo, atingimos a trilha conhecida num piscar de olhos e assim apressamos o passo, pois agora sim a fome comecava a apertar. Finalmente, as 8:30hrs alcançamos a estrada principal e dali começou nossa longa jornada de 7k entediantes ate o Bairro Penteados, onde chegamos por volta das 10:15hrs. Exaustos e tremendamente quebrados, o Nando imediatametne telefonou pra dar noticias do seu sumiço a sua família, e na sequencia estacionamos no mesmo boteco onde pedimos infos no dia anterior. O jovem dono parece não tere acreditado na nossa estória, mas e daí? Quem acreditaria q passamos a noite no mato com a roupa do corpo naquel fim-de-mundo? Tomamos umas brejas e mandamos ver alguns salgados pra comemorar o sucesso da nossa empreitada perrengosa.

O retorno pra Sampa foi embalado no mundo dos sonhos, nas trocentas e intermináveis baldeações necessárias pra isso. Como não poderia deixar de ser, constatei carrapatos pelo corpo como souvenires daquela trip nababesca pela serra. Mas a despeito da nossa desventura  involuntária  e eventualmente inerente a este tipo de empreitadas da serra, a trip descortinou um novo setor q certamente merece novas incursões, claro q desta vez com o devido planejamento e preparo. Desnecessario mencionar q fiquei pilhado em percorrer td aquele cânion do Rio Macacos até o final, na foz com o Mambu. Ou até uma descida de completa ate Itanhaém, mediante trocentos rapeis, percorendo tds os rios e cristas serra abaixo. Pois bem, são apenas possibilidades futuras ainda a serem estudadas. Mas independentemente disso, uma coisa é certa nesta vida de andanças pelo mato, tanto q até virou um trocadilho com direito a rima:  trilhar na Serra do Mar é uma arte! E o perrengue, claro, faz parte!

 

Jorge Soto
http://www.brasilvertical.com.br/antigo/l_trek.html
http://jorgebeer.multiply.com/photos

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Sobre o autor

Jorge Soto é mochileiro, trilheiro e montanhista desde 1993. Natural de Santiago, Chile, reside atualmente em São Paulo. Designer e ilustrador por profissão, ele adora trilhar por lugares inusitados bem próximos da urbe e disponibilizar as informações á comunidade outdoor.

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