O Parque Arthur Thomas

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O Parque Municipal Arthur Thomas é uma típica floresta urbana localizada em Londrina, norte parananense, e tem tudo pra ser o “Ibirapuera” da cidade. Contudo, com características próprias, inúmeros atrativos naturebas e detentor dos últimos ptos remanescentes de Mata Atlântica da região, é possível que esta unidade de conservação – cujo nome homenageia o desbravador escocês fundador da cidade – se enquadre mais num Jukery, PE Serra do Mar ou até mesmo Cantareira, se formos compará-lo a áreas similares em terras paulistanas. E o q pensei q seria apenas mais um “passeio no bosque” resultou num breve e incrível rolê urbanóide por trilhas de tds tipos, algum vara-mato, trocentos bichos e uma enorme cachuzona de mais de 50m.

Aproveitando um dia livre aproveitei o comecinho da tarde pra conhecer o Arthur Thomas, uma das poucas pendências urbanóides locais q precisava ser riscada do meu bloco de anotações. Pedi pra Lau algumas informações básicas, tipo condução, e la me mandei na boa malha rodoviária q a capital londrinense dispõe pra seus habitantes no quesito transporte público. Diferente da paulistana, a daqui é rápida e é bem eficiente, e num piscar de olhos saltei no terminal central, onde faria uma baldeação (gratuita) pro meu derradeiro destino.

Logicamente  q fui munido do tradicional guia impresso de ruas da cidade, de formato bem menor q o da “4 Rodas”, mais eficaz q qq GPS. Não q haja necessidade mas eu, particularmente, munido com qq croqui da cidade (ao invés duma carta topográfica) me viro onde quer q seja.  Além do mais, tem o bom e velho ditado q diz: “Quem tem boca…”
Do terminal central tomei qq busuca q fosse pro sul e me deixasse numa via próxima do pque. E dessa forma embarquei num tal de “Shopping Catuai”, decidido a saltar nas margens do belo Lago Igapó e dali seguir  tranquilamente a pé ao Arthur Thomas q, pelo guia, não distava muito. Sei q tem busão direto pro pque (basta se informar no terminal), mas minha idéia era mesmo passear um pouco antes. Num piscar de olhos me vi saltando na bela Av. Higienópolis, logo antes da ponte q cruza o lago. No Yate Clube, pra ser mais exato, as 10:30hrs. O Lago Igapó (“transvasamento de rios”, em tupi) é o resultado do represamento do ribeirão Cambezinho e q foi urbanizado de modo a servir pros londrinenses como área de lazer, tal qual os dois gdes lagos situados no Pque do Ibirapuera. Pistas, ciclofaixa, área gramada extensa, esportes náuticos, etc.. curiosidade é notar o belo lago como divisor de castas, uma vez q de um lado se situa a classe média e do outro gente (bem) mais abastada, marcado por belas e estonteantes mansões. Com direito a jet-sky na “garagem”..

O lago termina numa pequena represa de pedras, e dali basta apenas acompanhar o curso dágua, sempre pela calçada. Não tem erro, em qq lugar tem boa sinalização e emplacamento indicando a direção do Pque Arthur Thomas, onde cheguei quase uma hora após saltar do busuca. “Rua da Natureza” indica uma placa, com mais do q propriedade em função do verde exuberante q recobre a portaria na entrada do parque. Aceno cordialmente pros guardinhas do posto florestal e passo pelos portões q guardam o parque. Até ali, nada demais. Nada q um Pq do Ibirapuera, da Aclimação ou até do Carmo não tenha. Uma profusão de placas (“Não alimente os animais!”) e avisos se sucedem quase q consecutivamente, mas me detenho por mais tempo pra memorizar o mapa geral de trilhas do lugar, de vários tamanhos de trajeto e niveis de “dificuldade”. Tds os caminhos são identificados pelo nome de bichos representativos do pque.

O parque, no geral, tá situado numa baixada q drena o Ribeirão Cambé e o afunila pra dentro dum fundo vale em direção ao q sobrou da antiga Usina Cambezinho, a primeira da cidade. Isso pode ser facilmente apreciado do alto dum belo mirante q, a semelhança dos seus similares no PE Jukery, permite uma panorâmica de gde parte da área. Por ser dia da semana o lugar esta praticamente deserto, o q me deixa mto mais a vontade e em contato maior com a natureza q me rodeia. Maritacas reclamam minha intromissão qdo decido primeiro palmilhar o setor oeste do parque, q se resume a “Trilha da Capivara” (1700m) e basicamente circunda o espelho dágua do Lago Cambezinho, belo e calmo espelho onde as águas do córrego do mesmo nome são represadas e contidas antes de tomarem seu furioso rumo sentido a antiga Usina. Lago q serve, inclusive, de pouso pra diversas aves migratórias.

A “trilha” nada mais é q um caminho calçado cercado de mto verde mas procuro me manter sempre na trilha gramada q a acompanha, bem mais a minha cara. Cruzo uma simpática ponte pelo pequeno Ribeirão Piza, me deparo com um quiosque de alimentação e um senhor de idade caminhando, no sentido contrario, a única vivalma ali ate então. O lago faz jus ao nome pq é não é difícil observar o maior roedor do mundo, descansando em bandos, na margem e nas ilhotas secas q bordejam o lago. Ao cruzar o pontilhão de drenagem do Ribeirão Cambé um forte mau odor invade minhas narinas, sinal mais q patente q o principal corpo hídrico da área urbana de Londrina, q corta a cidade de cabo a rabo e deságua no Ribeirão Três Bocas (sul), é o equivalente ao Tietê paulistano, inclusive no quesito agressão ambiental e despejo de td espécie de poluição, q so não entra no lago por conta duma enorme grade q filtra a maior parte destes dejetos urbanos.

Ao caminhar pela margem norte do lago me deparo com outro habitante local, um enorme teiuzão q parece ignorar minha presença, e faz ate pose pra ser fotografado e filmado descansando ao sol do meio-dia. Mas ao notar cada vez mais minha aproximação se pirulita mata adentro, inviabilizando aquele close fatal q quiçá o estampasse na National Geographic. Logo adiante observo algumas arvores derrubadas, com as raizes expostas ao céu. A região em torno o lago é relativamente aberta e sofreu um tanto com o recente vendaval q se debruçou na região sul do pais, o q pode ser facilmente constatado aqui.

O lago termina num pontilhão sobre a enorme Barragem Cambé, onde as águas  mansas despencam com um pouco mais de força e se afunilam em direção ao fundo do vale, a leste. É daqui q partem as demais picadas e caminhos em meio a muito mais farta e densa vegetação, e foi este setor q particularmente gostei mais por ser relativamente mais rústico e parecido com minha adorável  Serra do Mar. Até pq o som abafado de veículos inexiste, como na picada anterior.  A trilha da vez é a da “Cuica” q, calçada, tem seus quase 830m e acompanha o Ribeirão Cambé pela sua margem esquerda, a distância. Já logo de cara o rugido duma queda desperta minha atenção e um breve e curto desvio da picada principal (q so depois descobri ser a “Trilha do Beija-Flor”) me leva no mirante superior da majestuoso Salto do Cambé, onde o rio se despeja cânion abaixo duma altura de mais de 50m com muita força e imponência. Particularmente não esperava (e nem sabia mesmo) q este parque urbano tivesse munido dum maravilhoso e majestuoso atrativo desses e só aquela visão já valeu o passeio. Claro q fiquei um tempão ali, admirando a queda, o cânion, o mato ao redor e td q mais tinha direito. Afinal, naquele pacato dia de semana, o lugar era td meu.

Dando continuidade a pernada pelo caminho principal (o da Cuíca), sempre acompanhando o curso do rio a distância, mergulho cada vez mais num belo bosque de altas arvores, cuja copa espessa chega até impedir a luminosidade de atingir o solo, e os poucos raios q conseguem penetrar no espesso arvoredo, filtrados, formam um lindo espetáculo de luz e formas em meio aquele panorama natureba. Visivelmente percebo q o caminho agora palmilha a encosta do cânion q o Rio Cambé serpenteia furiosamente a minha direita, no vale abaixo. Mas outra saída pela direita desperta minha atenção, q pelo croqui do parque corresponde a “Trilha do Lagarto”, mas q cujos íngremes 150m estão obstruídos tanto por fita isolante como por arame farpado por algum motivo. Percebo q por algum motivo esta picada, q leva ao mirante inferior da cachu, está proibida por algum motivo. Procuro conter ao máximo meus impulsos de “pular a cerca” e adentrar na proibidona, sem sucesso, claro. Eu preciso conhecer esta picada.

Mergulho enton na mata fechada, uma vez q esta íngreme picada está totalmente coberta de mato, pelo desuso. Cipós e bromélias se agarram com força ao q sobrou do corrimão do q outrora foi uma íngreme escadaria, onde taquarinhas, capim-navalha e algum mato menor forram parcialmente o chão concretado. A descida é forte mas desimpedida pra quem tem traquejo por trilhas serranas, principalmente qdo há alguns gigantes da floresta tombados no caminho. Pula ai, agacha aqui, desvia acolá e por ai vai. Ate q finalmente alcanço a margem do rio, onde percebo o motivo da interdição da picada. Um enorme desmoronamento (provavelmente devido a alguma chuva torrencial atípica) levou metade da encosta do cânion pra baixo, inclusive a escadaria q dava acesso ao mirante inferior da cachu! A visão do estrago impressiona, mas não impede q eu escalaminhe (com muito cuidado) o mato da encosta e alcance o tão almejado mirante. Uma vez no mirante (ou o q sobrou dele) pausa pra mais fotos e contemplação da enorme queda, so q duma vista frontal de td seu esplendor.

Na sequência dou continuidade a minhas andanças. Pra não retornar pelo mesmo caminho decido prosseguir pela “Trilha do Quati”, cujos 150m nada mais são continuação da picada anterior e acompanham o leito pedregoso do Córrego Cambé. Logicamente q tb é proibida e se encontra nas mesmas condições q a anterior, ou seja, parcialmetne fechada. E assim continuo agachando aqui, desviando ali e saltando esta ou aquela arvore caída no caminho, sem gdes dificuldades mas q me deixam alguns raladinhos básicos nos antebraços. Nos finalmentes, a picada abandona o rio e sobe forte a encosta como q pra reencontrar a “Trilha da Cuica”, logo acima. A íngreme picada, ornada em td sua extensão por bijus e marias-sem-vergonha ganha um colorido especial e torna a ascensão bacana.

Num piscar de olhos emerjo na supracitada  picada principal, onde sou recebido por varias placas indicativas da fauna e flora do pque. Logicamente q a entrada da “Picada do Quati” tb se encontra fechada com arame farpado e sem nenhum indicio de sua nomenclatura, tal qual a anterior. Sim, o fechamento é necessário pq realmente o trecho desbarrancado pode gerar algum risco pra quem não tem alguma experiência previa com escalaminhada, mas fora isso creio q as veredas tão ainda aptas pra uso. Mas aí é por conta e risco, claro. De qq forma, pra mim valeu a pena conhecer estas picadas proibidonas a minha maneira, de modo a sentir realmente o cheiro de mato revigorante.

Da “Trilha da Cuíca” decido tomar a “Trilha da Cotia”, q basicamente em 620m acompanha a primeira um nível acima da encosta, sempre tendo ao seu lado uma antiga adutora concretada. O percurso é tranqüilo e em nível, sem problema algum. No trajeto cruzo o Córrego Pica-Pau, curso dágua q despenca encachoeirado encosta abaixo e é gde tributário do Rio Cambé. Encaixotado num vale em “V” por diversos blocos rochosos de composição basáltica,  seu poder erosivo é tão gde qto o do rio principal e podem ser observados vários pequenos desmoronamentos em ambas margens. A picada termina abruptamente na adutora, num mirante cercado de mata q dá vista pro vale verdejante cercado de mata.

Dali tomo os  quase 200m íngremes da escadaria q corresponde á “Trilha do Jabuti”, q desemboca outra vez no finalzinho da “Trilha da Cuica”, mais precisamente nas ruínas da antiga casa de máquinas da Usina Cambé, a primeira hidrelétrica de Londrina q funcionou por quase 30 anos e aproveitava a força gerada pela enorme Cachu Cambé. Aqui vale um adendo histórico q remete ao fundador da cidade q dá nome ao pque, Arthur Hugh Miller Thomas, como já mencionei anteriormente, foi o escocês desbravador de Londrina. Natural de Edimburgo, foi convidado pra chefiar no Brasil a empresa “Brasil Plantations Syndicate”, mas não tardou pra tb gerenciar a Cia Terras Norte do Paraná, responsável pelo abastecimento de energia elétrica da cidade, q construiu a usina. O parque é recente  – foi fundado em 1975  – e foi criado um tempão depois do fechamento da usina, graças a doação daquelas terras pela Cia Melhoramentos, q adquiriu a região posteriormente sob condição de preservação ambiental.

Daqui não me restou opção senão retornar td trajeto pela bucólica “Trilha da Cuíca”, agora no sentido contrário, até chegar novamente na barragem de pedras. Ali é possível avistar a última picada do pque, a “Trilha dos Macacos”, q passeia por quase 1km pela encosta oposta do Ribeirão Cambé. Pra variar, este caminho se encontra  igualmente fechado por uma fita isolante e sem sinalização alguma, mas nada q outra “pulada de cerca” não resolva. Enfim, uma trilha de fato, de chão batido e sem cimento ou piso algum artificial. Ela segue bem batida por um tempo até ser bruscamente interrompida por um deslizamento monstro q a fechou totalmente na altura do Córrego Monjolo.  No caminho, araucária, pau-dálho, canjarana, cedro, ingá, jacarandá, peroba, palmito, gurucaia, catiguá, figueira, entre outros belos exemplares permeiam esta bela floresta urbana.

Sem trilha, aqui é necessário avançar pela encosta através por cima das vigas e manilhas de concreto q servem de “ponte” improvisada sobre o supracitado córrego. Galgando uns degraus da encosta e varando pouco mato sobre rastros de vereda é possível reencontrar a continuidade da “Trilha dos Macacos”, logo adiante. Diferente do trecho anterior, aqui o caminho ta bem mais fechado e menos óbvio q antes, mas é possível seguir em frente atentando pra rastros de mato baixado, sinal q alguém  circula ainda por aqui. O símbolo do parque e animal q empresta nome á trilha, o tal macaco-prego, não vi sinal. Dizem q ele existe aos montes, mas durante minha breve visita não vi o bichinho nem pintado. Aliás, pintado sim, mas somente sua esguia ilhueta escancarada no logotipo da unidade de conservação. Vai ver por conta da ausência de visitantes o famoso primata optou por ficar na moita, sem ficar se exibindo afim de mendigar comida.

Mas minha jornada termina após percorrida quase 80% da vereda qdo outro deslizamento gigantesco obstrui o caminho. Sem saco e mto menos paciência pra varar mais mato, dou meia-volta e retorno pelo mesmo caminho, satisfeito pela visitação mas principalmente doido pra molhar a goela com cerveja gelada diante meu relapso de não ter carregado cantil algum a tiracolo. Durante a volta, já quase de saidinha do pque, tropeço com a segunda  vivalma do dia, um guarda florestal de moto circulando pelo local. Troco algumas palavras e me informo do motivo de fechamento da última trilha percorrida: alem dos deslizamentos óbvios q impedem passagem, a presença de caçadores freqüentes na vereda q vira e mexe trocam tiros com os defensores da unidade de conservação. Noutras, os riscos inerentes do bicho homem.
 
Pra finalizar, minha última imagem do lugar é uma serelepe família de quatis revirando o lixo, o q não pode se dizer q seja uma imagem divertida ou digna de nota. Assim como eles, não via a hora de refrescar o gogó com malte gelado, no caso, com uma pitoresca breja chamada de Dama do Lago. Enfim, por volta das 14hrs deixava aquele oásis de natureza semi-selvagem verdejante pra adentrar novamente na acinzentada urbe londrinense, numa mudança abrupta mais q perceptível. E pra quem acredita q parques  deste naipe são enfadonhos e sem graça, q reconsidere pois é possível tornar um simplório “passeio no bosque” numa agradável aventurinha perrengosa digna de nota. E desta maneira descobrir belas e gratas surpresas em plena cidade,  seja ela qual for. Pérolas inseridas, no caso, em pleno centro urbanóide, no miolo do aparente “enfadonho e sem atrativo”  do chamado Terceiro Planalto Paranaense.

Jorge Soto
http://www.brasilvertical.com.br/antigo/l_trek.html
http://jorgebeer.multiply.com/photos
 

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Sobre o autor

Jorge Soto é mochileiro, trilheiro e montanhista desde 1993. Natural de Santiago, Chile, reside atualmente em São Paulo. Designer e ilustrador por profissão, ele adora trilhar por lugares inusitados bem próximos da urbe e disponibilizar as informações á comunidade outdoor.

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