A trilha do oleoduto

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Pertinho de São Paulo existe um caminho que agrada tanto a jipeiros, motoqueiros, bikers e até andarilhos em busca de adrenalina. É a “Trilha do Oleoduto”, chamada assim por ser onde a Petrobrás abriu caminho pra instalação (e depois, manutenção) duma extensa rede de dutos e que rasga, no sentido norte/sul, boa parte da bucólica região de Santana do Parnaíba. Sim, aquele quadrante a muito deixou de ser selvagem, mas ainda tem seu charme interiorano, com morros cobertos de reflorestamento/mata secundária, mirantes, riachos, fazendas e até animais silvestres. Por ser uma rota bem extensa, arrumei meio período dum domingo sem ideias mirabolantes apenas pra conhecer os tortuosos 6kms do trecho que vai de Jordanésia até São Benedito, incrivelmente repleto de altos e baixos de responsa.

Como a ideia era um bate-volta breve e sem gde necessidade de levantar cedo, cheguei na Lapa por volta dumas 8hrs e imediatamente embarquei no azulzinho intermunicipal da viação Urubupungá rumo Jordanésia, q sai de hora em hora. A manhã, radiante e transparente, já sinalizava q aquele dia seria bastante ensolarado e quente. Viagem relativamente rápida, não tardou pra paisagem emoldurada pela janela desse lugar ao asfalto da Rod. Anhanguera (SP-330), de onde destoou a silhueta escarpada e imponente do Pico do Jaraguá, espetando o céu pela direita.

Saltei em Jordanésia por volta das 8:50hrs, em frente ao curioso “Boiódromo”, meados da Av. Vereador Joaquim Pessoa Barbosa. Em tempo, Jordanésia é um pacato distrito do município de Cajamar, assim como seu vizinho menor, Polvilho. Pois bem, cruzei o Córrego dos Cristais até o final da avenida, de onde tomei o asfalto da Av. Dr Antônio João Abdala e por ela me pirulitei indefinidamente, dando enfim as costas á Jordanésia. E tome chão interminável esse aí, onde a paisagem começa entediante e se resume a fachadas de industrias e enormes aterros q compõem o importante centro logístico do distrito. Mas depois de um tempo o verde começa a dar as caras, principalmente qdo a via se embrenha em meio a respeitáveis morros de reflorestamento.

Mas pouco antes das 9:20hr tropeço com a enorme vereda almejada cruzando o asfalto, mais precisamente na frente dum galpão enorme da empresa dos Correios. O aceiro do oleoduto é largo e coberto de baixo capinzal, onde a vereda se esgueira sorrateiramente em meio ao pasto, inicialmente sem desnível algum. Um correguinho no caminho é transposto através duma decrépita pinguela, e é somente depois dele q a declividade começa a apertar. O caminho empina de tal forma e o suor começa a correr farto pelo rosto. A vereda, composta ora de terra solta ou chão seco e escorregadio, exige atenção redobrada e não raramente auxilio das mãos, q se firmam no alto capinzal em volta de modo a facilitar a ascensão. Mas devagar e sempre ganho altitude e logo meus horizontes se ampliam, onde posso avistar a continuidade da vereda (em ambas direções) cercada de verde, morros e eventualmente algum galpão destoando de td aquele bonito visual.

No alto, o caminho se alarga num picadão de terra q desce pro outro lado, pra então palmilhar a crista abaulada daquela baixa morraria em meio a um mar de eucaliptos. A paisagem so é maculada a nordeste por um vasto terreno terraplanado, provavelmente onde será instalado mais um centro logístico. Na descida, a picada se estreita até ser tomada por mato, no fundo do vale, onde desvio dum minúsculo córrego afim de manter os pés secos. Sim, agora em tds as baixadas seria confrontado com presença de água, seja na forma de córreguinho, lama ou verdadeiros “banhados”.

A subida seguinte é breve e logo retomo o sagrado ritual da descida, agora mediante um picadão q desvia ligeiramente pra esquerda. Uma vez no fundo deste vale repleto de brejo bem q tento, mas é impossível sair dali sem molhar os pés. Dane-se. E chapinhando com água até as canelas ganho a encosta a minha frente, dando continuidade a ascensão sgte agora com a vereda ligeiramente mais estreita q antes. Uma vez no alto intercepto um caminho maior e mais batido q indica ali passar uma estrada de reflorestamentos. Marcas de pneus enormes corroboram minha assertiva assim como toras empilhadas a minha esquerda, assim como inúmeras picadas menores q nascem das laterais. E enqto medito sobre tais veredas deixo a brisa fresca soprar meu rosto, ao mesmo tempo em q vista adiante mim se revela um legitimo “mar de morros”, paisagens recorrentes duma saudosa Serra da Bocaina.

A descida sgte é íngreme e se dá através duma precária estrada, q não tardo em abandonar em prol duma picada q mergulha no baixo capinzal. No fundo do vale sou novamente contemplado com botas molhadas, mas a árdua subida q se segue dilui a sensação de umidade q domina meus pés. No alto o terreno suaviza e nivela durante algum tempo, ainda bem. A navegação é fácil e simples, pois basta seguir o largo aceiro, placas ou os marcos amarelos da “Transpetro”. Não tem segredo. Virando então suavemente pra noroeste a vista descortina bela paisagem a minha direita, enqto a esquerda é dominada por um paredão de eucaliptos perfilados.

Mas td q é bom dura pouco pq logo na sequência encaro um íngreme descidão – através duma vala bem erodida –  q requer um pouco mais de jogo de cintura e equilíbrio pra não deslizar morro abaixo. A paisagem desta vez revelada sob forma duma bela, abaulada e verdejante morraria no quadrante norte lembra algum quadrante da Serra do Itaberaba, com destaque pruma imponente antena na maior elevação q desperta meu interesse, situada a a nordeste. No fundo do vale atravesso um enorme brejo com água até o tornozelo, ainda não dando chance alguma pro meu calçado se manter seco. Não bastasse, minha presença assusta uma cobrinha tomando sol, q mergulha colericamente capinzal adentro num piscar de olhos.

A nova subida desta vez é mais exposta q a anterior e se dá através duma vala íngreme, dura e compacta, composta por barro seco e liso. O sol a pino faz deslizar o suor pela ponta do meu nariz no exato momento em q passo por baixo dumas linhas de alta tensão. No alto, uma merecida pausa pra retomada de fôlego e ótimo lugar pra decidir a direção da continuidade da pernada. Digo isto pq simplesmente esse simplório sobe-e-desce-morro me consumira algo de 3horas, e já era hora de pensar em voltar.

Abandono o aceiro e tomo uma vereda paralela q logo me deixa no primeiro sinal de civilização local, ou seja, o minúsculo bairro de São Benedito. Ali tenho uma bela panorâmica (semi-rural, diga-se de passagem) da continuidade do aceiro formando um risco sobre o resto da abaulada serrinha, e tocando na direção da Serra do Japi. Mas meu olhar se volta mesmo pro morrão da antena avistada anteriormente (lembra?), bem próximo agora. Em São Benedito, um pacato vilarejo composto de igrejas evangélicas, uma escolinha, algum comércio e casebres bem simples, procuro me informar do acesso ao tal morrão mas sou recebido apenas com negatividade por parte do povo. Pior ainda, as pessoas consultadas me alertam do morro ser propriedade particular e do seu acesso ser proibido. Não q isso fosse impedimento, mas o que me deixou ressabiado mesmo de subir o morro foi o aviso complementar q o lugar era tb “vigiado por um boi furioso, quase que mudado geneticamente”, elã informações coletadas.

Como estava ali apenas pra conhecer de sopetão a região deixei de lado o “morrão da antena” e dei por encerrada a caminhada pouco depois do meio-dia. Antes de vazar pela Av. das Nascentes, claro, encostei numa pocilga daquele cafundó rural de Santana do Parnaíba e entornei uma gelada antes de dar continuidade a pernada, no caso, a volta. Retornei os 5km que me separavam de Jordanésia pela margem escaldante do asfalto da Rod. Anhangüera sob um sol de fritar miolos, mas uma vez no distrito encostei novamente noutro boteco antes de tomar a condução definitiva pra Sampa.

A “Trilha do Oleoduto” é extensa e se estende do norte de Barueri até pouco além de Jundiaí. É programa tranquilo e breve dependendo do trecho palmilhado, ideal mesmo pra “chinelar” por meio-período. É verdade, ela não tem o encanto selvagem da Serra do Mar nem a altitude generosa da Mantiqueira. Contudo, a proximidade e facilidade de acesso, somados às dificuldades do desnível acumulado de td seu trajeto fazem quem q esta rota artificial seja opção natural da galera local em busca de adrenalina, seja ela motorizada ou não. Isso sem mencionar o belo visual descortinado ao largo de td sua extensão, pois há trechos onde se avista nitidamente a cidade de São Paulo e o Pico do Jaraguá. Qdo tiver a tóa noutra ocasião quiçá encare o trecho sul deste caminho, tocando pra Polvilho ou até Barueri. Ou quem sabe me anime a conhecer o “Morro da Antena” e, consequentemente, desafiar o tal “boi raivoso mudado geneticamente”.
 

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Sobre o autor

Jorge Soto é mochileiro, trilheiro e montanhista desde 1993. Natural de Santiago, Chile, reside atualmente em São Paulo. Designer e ilustrador por profissão, ele adora trilhar por lugares inusitados bem próximos da urbe e disponibilizar as informações á comunidade outdoor.

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