Gustavo Ziller: Do sonho à realidade

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Gustavo Ziller nasceu em Minas Gerais, porém sua vida não tinha nada com aquele jeitão sossegado mineiro. Em 2012, graças ao stress, quase teve literalmente um piripaque no meio da rua em São Paulo.

Do susto, surgiu a razão que apontava a necessidade em mudar de estilo e de rítimo de vida. E naquele mesmo ano planejou algo que seria impensado até então: um trekking ao Campo Base do Annapurna, no Nepal. E, dessa mudança e toda a preparação que ele literalemente trata como um ritual de passagem, já rendeu um livro que será lançado esse ano. Porém como montanhistas, sabemos que a montanha chama constantemente… E depois de ser picado por esse mundo é difícil abandonar.
 
Gustavo Ziller manteve seu projeto. Mudou de cidade, de ritmo de vida e reencontrou velhos amigos. Seu tempo até de sonhar. E sonhar grande, atendendo o ˜chamado das montanhas", planejou o Sete Cumes em 30 Meses, ou, como ele fala: "7S30M". 
 
E com o dom empreendedor que lhe é neto, colocou a pastinha com seu sonho e projeto embaixo do braço e se lançou ao mundo em reuniões com produtoras, conhecidos e amigos, até que chegou na mesa do Diretor do Canal Off, Guilherme Zattar.
 
A história de Ziller é simples, porém muito ambiciosa. É a história de uma pessoa comum, com filhos, sonhos, trabalho e contas pra pagar. E que para acumular mais e mais histórias que valem ser contadas, decidiu se tornar um montanhista e para isso estipulou uma meta, digamos, atrevida: escalar as montanhas mais altas de cada continente na primeira tentativa.
 
Dessa conversa inspiradora nasceu o programa 7 Cumes, cujo primeiro capítulo, a escalada do Aconcagua, irá ao ar no próximo dia 11 de abril, no Canal Off. 
 
Leia nas linhas abaixo a entrevista exclusiva que o Gustavo Ziller deu ao AltaMontanha.com:
 
AltaMontanha – Gustavo, sabemos que você é um bem sucedido empresário brasileiro. O que te levou a sair do escritório e partir para as montanhas?
 
Gustavo Ziller – Antes queria dizer que o conceito de sucesso é bem relativo. A maioria das pessoas relaciona com grana, quanto mais dinheiro mais bem sucedido. Confesso que ingenuamente já pensei assim, mas hoje percebo o ‘bem sucedido’ de outra forma. Pra mim tem a ver com o tempo que uma pessoa tem pra desenvolver projetos que realmente ama, nesse caso, concordo contigo em me colocar na turma dos bem sucedidos. 
 
Por isso o que me levou para as montanhas tem a ver com essa parte da resposta. Eu senti uma necessidade enorme de ir mais longe, de explorar algo que nunca havia explorado. Um sentimento que começou após um piripaque em plena Av. Cidade Jardim em São Paulo, fui parar no hospital e depois disso percebi que estava enferrujando, no limbo. Busquei o improvável nas montanhas para me reencontrar como homem, amigo e pai.
 
AM – Um projeto assim (7 cumes) é bem audacioso. Acredita que isso tenha haver com seu espírito empreendedor? 
 
GZ – Verdade, digo aos amigos que é um projeto atrevido. Escalada alpina não é simples, senti isso na pele no Aconcágua. O fato é que sou muito caxias, quando ponho uma coisa na cabeça me dedico a ela incondicionalmente, e quando decidi seguir nas montanhas depois de um trekking ao Campo Base do Annapurna, no Nepal, pesquisei muito pra decidir o próximo passo. E montei uma equipe de suporte muito profissional, busquei um montanhista dos mais experientes do mundo para o projeto, li, reli e escrevi um livro sobre o processo. Foi quando, naturalmente, o 7 Cumes surgiu e me pareceu um desafio com equilíbrio entre dificuldade e possibilidade, principalmente para uma pessoa comum que até agora está no processo de se tornar um montanhista. Tenho uma palestra chamada Empreendedorismo Criativo, e todo o processo do 7 Cumes passa por isso. 
 
AM – O Aconcagua foi seu primeiro objetivo. Existiam montanhas mais fáceis para serem a primeira, por que você escolheu essa montanha para iniciar o projeto? 
 
GZ – Confesso que foi um erro. Escolhi pela facilidade na logística e proximidade da Argentina, mas nem imaginei o pepino que seria… Chegando lá e começando a escalada percebi que seria mais difícil do que planejamos. Foi quando o Máximo, líder das Expedições do 7 Cumes, mudou parte da programação para nossa aclimatação ser perfeita. Respeitamos muito o ritmo da montanha e surpreendentemente conseguimos culminar o Aconcágua na primeira tentativa.
 
AM – Aproveitando, como foi a escalada? E qual foi a maior dificuldade? Sentiu medo?
 
GZ – Subimos pela rota Noroeste, a com menos dificuldade técnica. Eu me preparei muito, como disse anteriormente, montei um time de ases para equipe de suporte, como exemplo, o líder desse time e chefe médico do time olímpico do Minas Tênis Clube e das categorias de base do Clube Atlético Mineiro. Tenho três treinadores, fisioterapeuta, nutricionista e especialista em medicina integrativa. Esse coletivo me deu muita confiança e isso refletiu na minha progressão na montanha. Eu não tive mal da montanha, não senti dores de cabeça e o pulmão ficou estável todo o tempo na montanha. As dificuldades foram o esforço físico extremo aliado ao frio e altitudes agressivas ao sistema imunológico, além da eterna luta psicológica para manter sua confiança em alto nível. Não senti medo, mas fiquei preocupado em alguns trechos da subida, por exemplo quando chegamos na Canaleta e cruzamos com o resgate de um polonês que havia morrido dois dias antes no cume. A cena mexeu com nosso time e foi uma luta enorme manter o psicológico funcionando depois disso.
 
AM – E a preparação? Aposto que nossos leitores que querem escalar essa montanha desejam muito essa informação…
 
GZ – Eu aprendi uma coisa no Aconcágua. Há 04 habitantes da montanha: o Explorador, o Profissional, o Aprendiz e o Turista. Esse último é o que corre mais risco porque acha que escalada em altitude é tipo ir à Disney (extremo do exemplo) ou fazer um trekking na Serra do Cipó. E não é. Sou um Aprendiz, por isso treinei muito e minha equipe está aperfeiçoando o treinamento para alta montanha com dados e feedback científico do que acontece e aconteceu com meu corpo. Eu estou adorando ser cobaia desse estudo criterioso. Mas claro que montar uma equipe desse tamanho é custoso e, de verdade, não é condição para o montanhismo. A condição é estar em uma Expedição super profissional sem nada fora do lugar. Na montanha você não pode ser exceção, tem que ser regra, por isso a Expedição tem que estar entre as melhores. Além disso sua preparação física para endurance tem que ser séria, o cansaço extremo pode te derrubar no primeiro trekking, vi isso no Aconcágua com um grupo de braileiros, por exemplo. A trinca de ouro desse esporte é planejamento, treinamento e equipe.
 
AM – Você utilizou os serviços do nosso colunista Maximo Kausch, através da empresa Gente de Montanha. Como foi? Recomendaria ele?
 
GZ – O Maximo se tornou integrante fixo do 7 Cumes. Ele tem uma responsabilidade enorme desde o Aconcágua, liderar e planejar nossas expedições. Depois disso fico suspeito em recomenda-lo, prefiro que os leitores do AltaMontanha procurem uma matéria da Go Outside Brasil em que o Maximo foi capa. (Máximo foi eleito o Outsider do ano em 2014) Posso dizer que com ele, não tem nada fora do lugar.
 
AM – O Aconcágua foi até agora o grande desafio de sua vida? É um desafio muito diferente dos quais já enfrentou em sua vida profissional?
 
GZ – Foi meu maior desafio até aqui, sem dúvida. Muito em função da jornada que me levou até lá. Foram doze meses de privação e treinos em dois, as vezes três períodos. Foram inúmeras leituras sobre o esporte. No processo tive problemas burocráticos, quase não consegui financiamento para o projeto, na paralela mudei de cidade, meus filhos de escola e minha família, literalmente, de vida. Isso tudo mexeu com todos nós. Por isso, a jornada ao Aconcágua foi intensa, a mais intensa que já vivi até aqui. E minha família e equipe foram fundamentais para essa primeira conquista.
 
AM – Sente que algo mudou após essa escalada?
 
GZ – Muita coisa mudou. Coisas objetivas como a compreensão do meu corpo e coisas subjetivas como a percepção da dimensão de um problema. Na montanha pra ser problema tem que ser um problemão, entende? Mas o interessante é que não foi o Aconcágua em si que provocou essas e outras mudanças. Como já mencionei, a jornada do 7 Cumes está me fazendo ir mais longe como homem, pai e marido. E isso é muito especial.
 
AM – Qual será a próxima etapa? Já tem uma data definida?
 
GZ – Esse ano temos o Kilimanjaro na África em junho, o Elbrus na Europa em outubro e o Vinson na Antarctica em dezembro. O desafio é conquistar os 7 Cumes em até 30 meses na primeira tentativa em cada montanha. Atrevido, né?
 
AM – Alguma consideração?
 
GZ – Pratique a vida criativa. E se escolher o montanhismo para sua evolução, seja um Aprendiz!
 
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Sobre o autor

Texto publicado pela própria redação do Portal.

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